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CUIABÁ GANHA, MAS NÃO LEVA.
A escolha de Cuiabá como uma das doze cidades brasileiras que sediarão a Copa do Mundo de Futebol - Fifa 2014 foi bastante comemorada e não foi somente por que vencer é bom e deixa qualquer um alegre.
A população logo percebeu que o maior evento esportivo mundial seria uma singular oportunidade para também ter solucionados vários dos seus problemas, já crônicos em termos de infraestrutura.
De fato, muitas intervenções logo foram anunciadas como necessárias para bem preparar a cidade para cumprir a sua parte no acordo feito pelo país com a Fifa, dona do evento.
Massificou-se a expressão ‘legado' como o grande objetivo de todo o esforço para alcançar tal vitória e também como justificativa para o significativo montante de recursos públicos que precisam ser investidos. A expansão, melhoria e modernização da prestação de serviços públicos e privados nas diversas áreas se fazem obrigatórias, assim como a demanda por melhor tecnologia.
Além do turismo, da segurança, da saúde, do esporte, da cultura e outras demandas. Ao final, passado o evento, tudo isso ficaria de alguma forma para o usufruto e benefício da população matogrossense, não só de Cuiabá e Várzea Grande.
Para a gestão e viabilização dessas expectativas, o Governo do Estado (do qual participei até determinado ponto - antecipo) criou autarquia, destinou orçamento e parte considerável de recursos próprios, fez projetos, fez compras e contratos, pactuou recurso federal do OGU.
Anunciou a arena Pantanal, fan park, centros de treinamento, ampliação do aeroporto, melhoras no receptivo turístico, um amplo leque de intervenções na mobilidade urbana, com modal BRT, viadutos, trincheiras, pontes, duplicação de vias e mais...
Contudo, também extinguiu autarquia, criou secretaria, retirou orçamento e recursos próprios, endivida-se com financiamentos, reduziu o volume de obras, desfez-se de projetos, substituiu o modal para VLT, desfez compras e contratos, os recursos do OGU foram reduzidos e segue mudando... Esta é uma resumidíssima abordagem de fatos.
Dentro desse rol está o propalado fan park, que é onde acontece o Fifa Fan Fest. É um local estruturado para grande concentração de pessoas nos dias de jogos da Copa, com instalações e equipamentos de alta tecnologia, serviços especializados e, sem dúvida, com imenso potencial indutor de desenvolvimento num pensamento mais estratégico e visionário.
A recém decisão pela sua transferência da histórica e tradicional região do Porto e bairros adjacentes para outro lugar é exemplo de mudança equivocada e prejudicial a Cuiabá e, ao que parece, mais uma vez sem maior consideração técnica e contextual, que atenda os interesses práticos e a original expectativa da população com o evento que sediará.
A opção pela área do parque de exposições foi feita para a requalificação urbanística daquela região da cidade, que tem sérios e conhecidos problemas de várias ordens, objetivando ainda a indução da retomada sócio-econômica das pessoas, dos empreendimentos existentes e estimulando que outros viessem a ser implementados em razão dos agregados turísticos e culturais propostos no entorno do fan park.
Imagino o quanto representaria para a cuiabania esse legado. Cuiabá ganhou essa oportunidade, mas não levou.
José Antonio Lemos, arquiteto e urbanista que se mistura com a "alma" da cidade, há muitos anos, me disse que "era preciso virar a cidade de frente para o rio Cuiabá" e valorizar aquela região por tudo o que representa para o povo cuiabano. Sempre concordei e acreditei que agora seria o momento. Meu amigo Zé, se ficarmos todos quietos, não será.
Afinal, "a cidade é dos que vivem nela" e não pode abdicar dos seus deveres e direitos. Se isso lhe for tomado, é despotismo.
CARLOS BRITO DE LIMA é ex-deputado estadual, foi diretor de Infraestrutura da antiga Agecopa (atual Secopa).